Nota do editor: Este artigo foi originalmente publicado em 10 de fevereiro de 2022.
A saúde mental é um tema sobre o qual muitas pessoas estão cada vez mais conscientes e procurando tratamento hoje em dia, especialmente durante a pandemia de COVID-19. Entretanto, de acordo com um dos estudos mais longos do mundo sobre transtornos mentais, uma parcela muito maior da população é significativamente afetada por transtornos mentais durante sua vida do que se acreditava anteriormente.
A cada ano, a Marjorie Pay Hinckley Endowed Chair in Social Work and the Social Sciences [Cátedra Marjorie Pay Hinckley em Serviço Social e Ciências Sociais] patrocina a visita de um acadêmico proeminente de Ciências Sociais à BYU para discursar sobre um assunto de interesse. Para a 18ª palestra anual no dia 3 de fevereiro, Terrie E. Moffitt, professora de Desenvolvimento Social na King’s College em Londres e professora de Psicologia da Nannerl O. Keohane University na Duke University, falou sobre seu trabalho de acompanhar mil neozelandeses por várias décadas e o que isso revelou sobre a saúde mental ao longo da vida das pessoas.
“A maioria das pessoas com quem converso presume que o transtorno mental é muito raro e, por isso, pode ser ignorado sem problemas pelos formuladores de políticas e pelo resto da população”, disse Moffitt durante sua palestra. “Mas quase ninguém percebe que ele é muito comum, especialmente entre os jovens. E é uma grande fonte de desigualdade e acarreta um grande custo aos cofres públicos. Porém, o mais importante é que a saúde mental é uma oportunidade de prevenção subestimada e fantástica para melhorar nosso processo de envelhecimento.
Clínicos de saúde mental e pesquisadores universitários normalmente só atendem pacientes quando eles procuram tratamento ou participam de um estudo.
“Nós nos concentramos em fazer o diagnóstico, porque nosso raciocínio é que o diagnóstico do paciente o representa adequadamente, assim como nos informa qual tratamento queremos escolher e qual será o prognóstico de sua doença a longo prazo”, disse Moffitt.
Entretanto, após ingressar no centro de estudos e pesquisas Dunedin Multidisciplinary Health and Development Study em 1985 [em inglês], a pesquisa de Moffitt a levou a “reconsiderar o que achava que sabia sobre os transtornos mentais.”
O estudo “começou em 1972 e incluiu um grupo composto por todos os bebês nascidos em uma cidade.” Etnicamente, eles são de origem branca europeia”, explicou Moffitt. Os indivíduos compareceram à clínica de estudo para um dia inteiro de avaliações e coleta de dados em 13 ocasiões desde que eram bebês. O estudo foi o primeiro a usar uma avaliação diagnóstica padronizada para medir o transtorno mental em crianças, subsistindo a quatro edições do manual de diagnóstico da Associação Psiquiátrica Americana.
Eles avaliaram 16 transtornos mentais em três tipos de categorias: externalizantes (TDAH; transtorno de conduta; dependência de álcool, maconha, tabaco e outras drogas), internalizantes (depressão, ansiedade geral, fobia social, fobia simples, pânico, TEPT, transtornos alimentares), e pensamento (esquizofrenia, mania, TOC). O diagnóstico dos transtornos exigiu evidência de disfunções na vida dos pacientes e a corroboração de um informante.
Eles descobriram que 85% do grupo experienciou um transtorno mental durante o curso do estudo entre a faixa etária de 11 e 45 anos, com a maior taxa de diagnóstico ocorrendo quando os participantes tinham entre 15 e 18 anos. As taxas de transtornos mentais no grupo diminuíram conforme os participantes envelheceram, mas parte da razão para isso é que “as pessoas com transtornos mentais tendem a morrer jovens por suicídio, overdose, acidentes e também por doenças físicas”, disse Moffitt.
O grupo do Dunedin não é o único a mostrar esta alta prevalência de transtornos mentais. Moffitt e sua equipe encontraram índices semelhantes de transtornos mentais no registro de tratamento nacional dinamarquês, em relatórios feitos pela Organização Mundial da Saúde e em outros estudos longitudinais realizados na Carolina do Norte, Orego, Zurique naSuíça, e Christchurch na Nova Zelândia. Ela observou que a doença mental é frequentemente subtratada, então os números de algumas dessas fontes devem ser ainda maiores.
Como Moffitt gosta de dizer a seus alunos: “Se você se mantém mentalmente bem durante toda sua vida, você não é normal.”
Uma coisa surpreendente que Moffitt e sua equipe aprenderam foi que “a mesma pessoa sofre de diferentes transtornos mentais ao longo de sua vida”, disse ela, observando que os transtornos diagnosticados também oscilavam entre transtornos externalizantes, internalizantes e de pensamento, sem um padrão perceptível.
Além disso, quanto mais cedo os participantes eram diagnosticados com um transtorno mental em sua vida, mais eles eram diagnosticados com transtornos mentais posteriormente, com uma variedade maior de transtornos diagnosticados.
Moffitt disse: “O ponto principal deste estudo é que algumas pessoas terão um histórico de distúrbios de saúde mental que começa cedo, dura muito tempo e inclui vários transtornos, ao passo que outras pessoas terão um distúrbio que começa mais tarde na vida, o qual incluiu somente um breve episódio e talvez apenas um diagnóstico. E a maioria das pessoas apresentarão um padrão que se encaixa entre esses dois extremos.
Aqueles que são diagnosticados com transtornos mentais mais cedo na vida também veem efeitos físicos mais tarde. “As pessoas com transtornos mentais envelhecem mais rápido, têm menos capacidade de gerenciar sua saúde e finanças, pois precisam se preparar para a velhice, sofrem de mais doenças físicas crônicas à medida que envelhecem, usam mais serviços de saúde, estão sujeitas a mais gastos relacionados a doenças físicas e também são mais propensas a desenvolverem demência”, disse Moffitt.
Os distúrbios mentais são tão relevantes para a mortalidade precoce quanto as doenças físicas, disse ela. “Entretanto, os distúrbios mentais ocorrem quando as pessoas são muito mais jovens e isto nos proporciona uma oportunidade de avanço para o tratamento preventivo.”
Reconhecer que a maioria das pessoas provavelmente terá um problema de saúde mental ajuda a reduzir o estigma contra a doença mental, disse ela. “E se houver menos estigma, então isso deverá estimular mais pessoas a se sentirem seguras para receberem tratamento e recebê-lo mais cedo.”