BERLIM, Alemanha — Dias antes da Páscoa, Liia pendurou, com muita animação, ovos de plástico coloridos nos galhos das árvores do lado de fora da casa suburbana que ela agora chama de lar.
Apesar de seu entusiasmo, a menina de 3 anos provavelmente estava um pouco confusa. Ovos e coelhinhos de Páscoa eram novidade para Liia, pois nenhum deles faz parte das tradições praticadas nesta época em sua terra natal, a Ucrânia.
Confusão e novidade definiram grande parte das últimas semanas para a jovem Liia e suas duas irmãs, Dasha e Elsza, junto com sua mãe, Natasha, e a cunhada de Natasha, Diana.
As duas mulheres da família e as três meninas estão entre os quase cinco milhões de refugiados ucranianos. “Refugiado” é uma classificação que elas nunca desejaram ter e que elas esperam abandonar em breve. Mas até que seja seguro retornar ao seu país, elas estão morando em Berlim.
Cada dia que Natasha e Diana vivem em uma cidade alemã localizada a quase 1.600 km de distância de sua terra natal, Kiev, é um dia difícil. Elas se preocupam com seu marido e irmão, John. Elas oram pela segurança de seus entes queridos e outros santos dos últimos dias. Elas assistem às notícias do dia com apreensão e orgulho por seus compatriotas que lutam por sua liberdade.
Mas as duas cunhadas são rápidas em acrescentar que não estão sozinhas. Elas estão se apoiando na companhia do evangelho e no apoio de outros santos dos últimos dias em Berlim que, antes do conflito em curso, eram estrangeiros e estranhos.
A família estã vivendo temporariamente com Oliver e Stephanie Berndt e seus filhos. O presidente Berndt é conselheiro da Estaca Berlim Alemanha. Várias outras famílias ucranianas encontraram abrigo e cuidados semelhantes nas casas de santos dos últimos dias na Alemanha e em outros países europeus.
“Quando conhecemos os Berndts, imediatamente nos sentimos como uma família. Foi como se os conhecêssemos de algum lugar há muito tempo”, disse Diana ao Church News. “Eles são muito gentis e solidários. Eles trazem esperança para nossa vida.”
Diana e sua cunhada, Natasha, falam inglês. Suas habilidades com o idioma as ajudam a se conectar com sua família anfitriã. “Mas, às vezes, pode ser difícil para minhas filhas porque elas não falam a língua”, disse Natasha. “Mas elas se sentem seguras aqui nesta casa. Elas estavam nervosas no começo, mas rapidamente relaxaram.”
Quando Élder Erich Kopischke, natural da Alemanha, Setenta Autoridade Geral e membro da Presidência da Área Europa Central, reflete sobre o vínculo entre refugiados ucranianos e suas famílias anfitriãs, como os Berndts, ele se lembra da amizade encontrada no Livro de Mórmon entre Alma e Amuleque.
Amuleque, observou Élder Kopischke, havia perdido tudo o que possuía, inclusive sua família e amigos, e fora expulso de sua terra natal.
Mas “Alma tomou Amuleque e dirigiu-se à terra de Zaraenla, levando-o para sua própria casa; e confortou-o em suas tribulações e fortaleceu-o no Senhor” (Alma 15:18).
Élder Kopischke disse: “Este atributo, demonstrado pelos verdadeiros seguidores de Cristo, estendendo a mão com amor e compaixão para aqueles que precisam de conforto, é o que observamos durante esta crise de diversas formas em toda a nossa área. Não apenas fortalece os necessitados, mas também fortalece aqueles que doam e servem. Isso nos torna melhores discípulos de Jesus Cristo e uma luz para o mundo.”
Membro da Igreja de longa data que serviu missão na Nova Zelândia, Diana estava longe de sua casa em Kiev, participando de uma conferência de Jovens Adultos Solteiros em outra parte do país, quando o conflito começou em 24 de fevereiro.
Seu choque de que a guerra realmente havia chegado à Ucrânia pode ser comparado apenas a seu medo.
“Acordei naquela manhã com telefonemas”, disse ela. “Estávamos sendo bombardeados. Todo mundo estava com medo. Todo mundo estava perguntando ‘o que está acontecendo’. Nós não achamos que isso poderia realmente acontecer no século XXI.”
Diana permaneceu com outra família por uma semana e rapidamente aprendeu a correr para um abrigo próximo, sempre que o som de sirenes enchia o ar. Depois de vários dias, ela decidiu que seria mais seguro deixar a Ucrânia e seguir para o oeste.
Sua cunhada, Natasha, é um membro converso da Igreja, que serviu missão de tempo integral na Rússia.
Assim como Diana, ela soube do conflito por meio de telefonemas e mensagens de texto. Nos primeiros dias do conflito, ela seguiu seu impulso natural de servir aos outros. Ela passou vários dias com suas três filhas em um abrigo improvisado e ajudou a distribuir alimentos e outras provisões para pessoas necessitadas.
“Foi terrível”, disse ela. “Mas as pessoas sempre procuraram formas para ajudarem e permanecerem conectadas umas às outras.”
Como sua cunhada Diana, Natasha percebeu que era melhor para ela pegar as meninas e sair temporariamente da Ucrânia para um lugar mais seguro. “Decidimos que precisávamos ir por causa das crianças”, disse ela. “Foi uma decisão difícil. Eu tenho uma vida normal. Eu trabalho e minhas filhas têm aulas de ginástica e karatê. Então, em um dia, tudo isso desapareceu.”
Deixar a Ucrânia significava dizer adeus aos entes queridos que ficaram para trás. O pai de 56 anos de Diana está servindo no exército reservista e foi designado para vigiar um posto de controle em uma estrada perto da capital. “Nós sempre estamos preocupadas com ele. Nunca sabemos o que vai acontecer.”
Conversar com ele por meio de mensagens de texto, ela acrescentou, traz conforto diário.
O marido de Natasha, John, é um profissional de TI. Mas, como tantos outros na Ucrânia, a guerra forçou uma “mudança de carreira” temporária. Agora ele passa seus dias ajudando a coletar e distribuir remédios e equipamentos de proteção, como capacetes, para soldados.
Natasha disse que seu marido enfrenta com firmeza os desafios de cada dia. “Ele nos diz que está tudo bem. Mas quando ele fala com nossas filhas, posso dizer que ele sente falta delas e que isso é muito difícil para todas elas. Minhas filhas choram. Todos os dias elas me perguntam: Por que não vamos para casa encontrar o papai?”
A jornada desta família de refugidas as levou à Polônia e à República Tcheca e, finalmente, à casa dos Berndts em Berlim, Alemanha. A bondade mostrada à sua família, por quem antes eram estranhos, aprofundou a compreensão de Natasha sobre o evangelho. Ela descobriu que é um membro valioso da comunidade global dos santos dos últimos dias.
“Em todo o mundo, há pessoas que vão ajudá-lo”, disse ela. “Sou muito grata por estar na Igreja. O evangelho me deu forças e sei que o evangelho abençoará a Ucrânia”
Membros de Berlim, e muitos outros, respondendo ao chamado para ajudar refugiados
Há quase cinco meses, o presidente da Estaca Berlim Alemanha, Rolf Reichardt, e seus conselheiros entregaram uma carta de ano novo aos membros da estaca, convidando-os a buscarem ativamente oportunidades para fortalecerem seus vizinhos, dando ênfase especial às orações diárias e ao estudo das escrituras.
“Mal sabíamos o quanto isso seria necessário para preparar nossa mente e coração para o que estava por vir — e em tão pouco tempo”, escreveu ele em um e-mail.
Trabalhando em estreita colaboração com a liderança da Área Europa em Frankfurt, os membros de Berlim organizaram esforços para se conectarem e ministrarem aos membros ucranianos, incluindo outros fugindo da Ucrânia que não são santos dos últimos dias.
“Somos muito gratos pelos muitos lares de membros dispostos a fornecerem acomodação temporária para refugiados ucranianos, pelas generosas doações enviadas à Ucrânia, por muitas iniciativas individuais para apoiarem os refugiados e pelas muitas orações que são tão importantes”, escreveu o presidente Reichardt.
Michael e Uli Gruse, membros da estaca Berlim, foram chamados para servirem como coordenadores dos esforços de ajuda aos refugiados da estaca. Os Gruces e outros, incluindo os missionários de tempo integral, realizaram uma variedade de serviços, incluindo preparar refeições para os refugiados quando eles chegam a Berlim e providenciar famílias anfitriãs, como os Berndts.
“No início, não sabíamos o que fazer; nunca fizemos algo assim antes”, disse Michael Gruse. Mas seus esforços foram guiados pela oração e pelo amor. Os Gruses conheceram muitos membros ucranianos durante seu serviço no Templo de Freiberg Alemanha. “Eles são pessoas maravilhosas e nós os amamos.”
Os membros da estaca Berlim responderam a cada chamado para servir, disse Michael Gruse. Além de abrirem suas casas, eles doaram suprimentos necessários, como sacos de dormir, alimentos e roupas. “Cada membro quis ajudar e fazer parte do apoio a essas pessoas maravilhosas. E não apenas para os membros, mas para todos os ucranianos.”
Os olhos de Uli Gruse ficam cheios de lágrimas quando ela se lembra de uma campanha local de alimentos e suprimentos organizada pela estaca Berlim.
“Pensamos que talvez os membros viriam e trariam o que pudessem. Mas trouxeram tanto que precisamos alugar um caminhão [para transportar as doações].”
O conflito em curso separou as famílias, acrescentou. “Mas membros e não membros se uniram para ajudar.”
Enquanto isso, os Berndts dizem que abrir sua casa para as Tenischevas tem sido uma bênção.
“Queremos ajudar e nos sentimos com muita sorte por termos uma família tão incrível em nossa casa”, disse Stephanie Berndt.
“Sou especialmente grato que meus filhos os acolheram tão naturalmente”, acrescentou Oliver Berndt.
Nas últimas semanas, as duas famílias encontraram paz e alegria ao prepararem refeições juntas e adorarem lado a lado durante as reuniões dominicais da Igreja. As crianças mais velhas de Berndt gostam de ter as meninas por perto para brincar e se divertir, apesar das barreiras linguísticas.
Oliver Berndt sente-se inspirado pela autoconfiança das refugiadas que estão abrigando. Elas permaneceram tão independentes quanto possível, mesmo em meio aos desafios atuais.
“Tentamos oferecer um lugar seguro”, disse ele. “Quando estão tristes, queremos dar-lhes espaço. Se elas querem se divertir, então nos divertimos com elas…. Rimos muito juntos.”
Encontrando esperança em Deus e na bondade de Seus filhos
Élder Dieter F. Uchtdorf, do Quórum dos Doze Apóstolos, passou recentemente um Dia do Senhor memorável com refugiados ucranianos que vivem na Polônia. Ele reconheceu as realidades sombrias de cada dia, mas lhes assegurou que a esperança pode ser encontrada por todos aqueles que se voltam ao Salvador.
Como as escrituras prometem: “O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã”. (Salmos 30:5).
Natasha e sua cunhada, Diana, choraram com frequência nas últimas semanas. Seus pensamentos nunca estão longe de sua terra natal e das pessoas que amam e com quem não podem estar. Mas elas encontram forças para perseverarem, elevadas pelo amor dos outros e sua esperança em Cristo.
“Alguns de meus amigos que não são membros da Igreja me perguntam: ‘Você pode orar por meu marido? Você pode orar pelos meus amigos que estão em combate?’”, disse Natasha. “Esta é uma oportunidade de compartilhar o evangelho. Esta é uma oportunidade de dar às pessoas esta esperança.
“É difícil entender o que está acontecendo em nosso país. Mas ainda tenho esperança, porque nossos profetas nos prometeram que teremos [mais] templos e que a [Igreja crescerá] na Ucrânia. Eu acredito nestas palavras. Estas palavras me trazem esperança.”
O Pai Celestial conhece e cuida de Seu povo, muitas vezes por meio de orações e ações de outros, acrescentou Diana.
Quando Diana ora, nem sempre recebe uma resposta imediata. “Mas sempre me sinto em paz. Eu sei que tudo vai ficar bem, mesmo que eu não saiba quando isso venha a acontecer.”