Em 1899, as missionárias Eliza Chipman e Josephine Booth, duas das primeiras jovens a servirem como missionárias de tempo integral para A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, estavam participando de uma reunião de rua, com “uma boa e grande multidão de pessoas inteligentes”, em Glasgow, Escócia, quando Chipman disse que “um homem de aparência diabólica” começou a protestar.
“Protesto contra os homens que acreditam no casamento com três ou quatro esposas que vêm aqui e pregam às pessoas honestas da Escócia livre”, disse o homem, fazendo com que mais pessoas parassem e ouvissem.
Chipman registrou o que aconteceu a seguir, em uma entrada em seu diário, datada de 9 de agosto de 1899 [em inglês]: “Josephine se levantou para falar e conquistou a atenção de toda a multidão, que ficou intensamente interessada. Depois que ela terminou seu discurso adorável e eficaz, fui chamada para falar à multidão e recebi a atenção que havia sido dada a ela. O diabólico opositor não disse mais nada, mas parecia pálido e mentalmente perturbado.”
A entrada, e muitas outras páginas registradas pelas missionárias pioneiras, bem como imagens e outros materiais, foram publicados on-line [em inglês], anunciou a Imprensa do Historiador da Igreja em um evento para a imprensa, na terça-feira, 19 de março.
Os diários, acessíveis gratuitamente em churchhistorianspress.org [em inglês], apresentam as experiências missionárias do dia a dia de Booth e Chipman, que serviram no Reino Unido de 1898 a 1901, e como companheiras na Escócia de 1899 a 1900. Junto com os diários, o site apresenta imagens, informações biográficas de muitas das pessoas mencionadas por elas, mapas que mostram onde serviram e viajaram, e outras fontes relacionadas [todos em inglês].
Como dezenas de milhares de santos dos últimos dias serviram missão, os diários missionários são uma parte importante da literatura santo dos últimos dias, disse Matthew McBride, diretor de publicações do Departamento de História da Igreja.
“Diários de missionários, em geral, são uma fonte importante para compreender a Igreja e como ela mudou ao longo do tempo. Eles também são importantes para se compreender a experiência dos jovens na Igreja”, disse ele. “Estas são duas das primeiras mulheres a servirem nesta função, e sua experiência nos diz muito.”
Estas fontes são significativas porque proporcionam “uma espécie de desenvolvimento marcante na história da participação das mulheres na Igreja”, disse Lisa Tait, gerente e especialista em história da mulher, do Departamento de História da Igreja.
“Há muitos pontos de contato, realmente interessantes, com a história das mulheres, e com a história das mulheres santos dos últimos dias em geral, relatados nesses diários”, disse ela. “A publicação dos diários de Booth e Chipman também reflete o compromisso contínuo do Departamento de História da Igreja, em destacar as vozes e experiências das mulheres santos dos últimos dias.”
Os diários também podem servir para inspirar futuras gerações de missionárias, disse Hannah Lenning, editora assistente do projeto. “Vemos um enorme valor nos diários para as jovens missionárias na Igreja hoje”, acrescentou ela.
As primeiras missionárias solteiras
Na década de 1880, a Igreja experimentou intensa oposição à sua prática do casamento plural. Autores, jornalistas, políticos e artistas retrataram as mulheres santos dos últimos dias como maltratadas e oprimidas.
Em 1897, Elizabeth Claridge McCune estava viajando por Londres, Inglaterra, quando teve a oportunidade de falar publicamente contra essas alegações. Sua eloquência e equilíbrio impressionaram Élder Joseph W. McMurrin, da presidência da Missão Europeia, levando-o a escrever à Primeira Presidência em Salt Lake City, e a solicitar missionárias na Inglaterra.
“Se algumas mulheres inteligentes e brilhantes fossem chamadas para uma missão na Inglaterra, os resultados seriam excelentes”, escreveu McMurrin.
A Primeira Presidência: Presidente Wilford Woodruff e os conselheiros, Joseph F. Smith e George Q. Cannon, todos homens com vasta experiência missionária, aprovaram o pedido e começaram a chamar formalmente mulheres, tanto casadas como solteiras, para servirem como missionárias de proselitismo.
Em 1898, Amanda Inez Knight e Lucy Jane Brimhall se tornaram as primeiras sísteres solteiras chamadas e enviadas para a Inglaterra. Chipman foi a segunda companheira de Knight, e Booth foi a segunda companheira de Chipman.
Eliza Chipman
Chipman nasceu em 1874 e foi criada em American Fork, Utah. Sua mãe morreu quando ela tinha apenas 3 anos e seu pai quando ela tinha 16. Ela trabalhou como professora antes de ser chamada como missionária aos 23 anos, de acordo com uma introdução no site [em inglês].
Quando Élder John W. Taylor, do Quórum dos Doze Apóstolos, designou Chipman como missionária, ele a abençoou [em inglês] dizendo que ela estaria “cheia do poder convincente do Espírito Santo” quando se apresentasse diante do povo, e que receberia todas as bênçãos necessárias para “qualificá-la como ministra entre os filhos dos homens.”
Em várias ocasiões, Chipman escreveu relatos detalhados de suas conversas com pessoas a quem ensinou, incluindo percepções sobre as linhas de raciocínio, tópicos principais e escrituras que as missionárias usavam em seu serviço.
Os descendentes de Chipman doaram seus três volumes de diários e outros documentos ao Departamento de História da Igreja, em 2017.
Josephine Booth
Booth nasceu em 1876 e foi criada em Provo, Utah. Seu pai, John Edge Booth, era um político local que também exercia a advocacia. Sua mãe morreu quando ela tinha 8 anos, segundo a introdução no site [em inglês].
Em um esboço autobiográfico escrito logo após sua missão, Booth escreveu que ela lutou com sua fé quando ainda era jovem. Seu testemunho foi fortalecido quando ela morou com uma família santo dos últimos dias devota por vários meses no Canadá. Ela também trabalhou como professora antes de sua missão.
Booth tinha 22 anos quando iniciou seu serviço missionário. Seus escritos apresentam o que ela viu, ouviu, vivenciou, e como se sentiu a respeito. As entradas também revelam um apurado senso de humor, inteligência e habilidade para contar histórias.
Seu diário mostra que Booth tinha uma profunda admiração pelo colega missionário e futuro Presidente da Igreja, David O. McKay. Os dois se corresponderam por vários meses após sua desobrigação, mas em junho de 1900, ele voltou sua atenção para Emma Ray Riggs, uma mulher que cortejou antes de sua missão, e mais tarde eles se casaram.
Os dois volumes do diário de Booth foram doados à Biblioteca de História da Igreja por sua família, em 2001.
Personalidade, humor e fé
McBride, Tait e Lenning concordaram que os diários das sísteres fornecem uma visão detalhada e única do trabalho missionário dos santos dos últimos dias, na virada do século XX. Embora o serviço missionário fosse diferente naquela época, os missionários modernos se relacionarão com muitos aspectos de suas experiências, como a rejeição frequente, a tensão entre companheiros com personalidades diferentes, a ansiedade de falar em público, o ânimo de experimentar um lugar e cultura novos e a alegria de ajudar outras pessoas a se aproximarem de Deus.
As páginas também estão cheias de personalidade e humor. Por exemplo, ambas as jovens escreveram sobre como enfrentar pulgas.
Booth escreveu em 2 de setembro de 1899 [em inglês]: “Saio [de] meu ‘repouso’ cerca de três vezes todas as noites, para continuar minha caça às pulgas. Falemos sobre [o famoso explorador Sir Henry Morton] Stanley na selva da África caçando leões, ele nunca saberá o que é uma ‘caça diligente’ até que cace pulgas.”
Chipman escreveu em 23 de novembro de 1898 [em inglês] que a primeira pulga que ela viu na vida a acordou de manhã, e encheu seu “coração de um desejo de acabar com ela”. Ela tentou encontrar a pulga, mas “ela saltou e nem sequer virou a cabeça para me agradecer pelo café da manhã.”
Em 25 de setembro de 1899 [em inglês], Booth escreveu sobre voltar para casa e preparar um “jantar americano para os rapazes”.
“A refeição foi um grande sucesso, exceto pelo fato que a sopa coalhou, o bife queimou, as cenouras não foram salgadas, o molho ficou muito grosso e o pudim muito ralo”, escreveu ela. “Desde aquele dia, o nome ‘jantar americano’ faz os meninos empalidecerem. Mesmo as estrelas e listras [da bandeira dos E.U.A.] não foram capazes de despertar o seu patriotismo. Espero que não sejamos tão desumanas a ponto de prepararmos mais um ‘jantar americano’, e fazermos com que os rapazes desprezem sua ‘terra natal’ para sempre.”
As sísteres ficaram cansadas de serem chamadas de “irmão” ou “élder”, observou Chipman em 28 de maio de 1900 [em inglês].
“Participei da reunião do sacerdócio que começou às 10h30 e terminou às 15h15″, escreveu ela. “Quando voltarmos para casa, teremos nos tornado homens, pois somos consideradas ‘irmãos’ e ‘élderes’ em todos os aspectos. Quando participamos de uma votação, somos todas anunciadas como em um leilão e chamadas de irmãos.”
O dia seguinte, significou muito para as sísteres quando um líder de missão voltou ao púlpito com um pensamento adicional após concluir sua mensagem. “Depois de pensar no que havia dito, [ele] se levantou novamente e disse que havia outra coisa que ele havia negligenciado. Depois passou cerca de 20 minutos elogiando as sísteres. É claro que não conseguimos reprimir as lágrimas e, como ontem, chorei e não pude evitar”, escreveu Chipman.
Booth escreveu sobre ser confrontada por um homem bêbado que se tornou “bastante sociável” com ela, a fazendo gritar. O homem então a perseguiu “em meio a muitas gargalhadas”. Naquela noite (12 de agosto de 1899 – em inglês), ela escreveu que “sonhou com homens bêbados e [santos dos últimos dias] perseguidos.”
Enquanto fazia proselitismo no início de sua missão, Chipman expressou medo de que alguém lhe fizesse uma pergunta que ela não pudesse responder. No entanto, ela “aproveitou ao máximo a oportunidade e seguiu em frente, como faria qualquer boa moça”, escreveu ela em 8 de novembro de 1898 [em inglês].
“Ajoelhamo-nos em oração antes de começar e pedimos a ajuda do Seu infinito poder. Ele, que é o Pai de todos, e tenho certeza de que nos deu forças. Retornamos muito favoráveis a irmos novamente.”
Outros diários, revistas e publicações
Os diários missionários das sísteres são os mais recentes de uma linha de publicações digitais da Imprensa do Historiador da Igreja. A lista inclui:
- O diário de prisão de Belle Harris.
- Os diários de Emmeline B. Wells.
- Os discursos de Eliza R. Snow.
- O diário de George F. Richards.
- O diário de George Q. Cannon [em inglês].
- Ao Púlpito: 185 anos de discursos proferidos por mulheres santos dos últimos dias.
- Os primeiros cinquenta anos da Sociedade de Socorro [em inglês].
Saiba mais em churchhistorianspress.org [em inglês].